26/06/2022

1981-2022

 

Ilidio Salteiro, 2019.
Óleo sobre papel com 100 cm x 150 cm, exposto em 2019 na Fundación Casa Pintada / Christobal Gabarron, Mula, Murcia, numa exposição intitulada «Paisagens de Trezenzónio» sob a curadoria de Olga Pomares e Juan Sandoval.



Atendendo ao facto de expormos aquilo que fazemos, aqui e agora, enquanto esperamos sossegadamente que tudo nos venha parar à mão sem que para tal façamos ou façais alguma coisa.

É preciso sair do ovo! A vida é hoje e não depois. A sorte com que se luta, é preciso fazê-la sair de tudo o que está feito, de tudo o que está vivo e não do que está morto.

Se eles não sabem que o sonho é tela, é cor é pincel, vaso fuste capitel, pináculo de catedral.

É altura de saberem. Já se perdeu muito tempo contraponto sinfonia. Estamos aqui para dizer que existimos. Estamos aqui para dizer que precisam de nós. Que não podem viver sem nós. O Mundo é dos que pensam, dos que sabem pensar, dos que sonham e sabem sonhar.

Um frango só por si não existe. Um galo serve para cantar quando o Sol se levanta no horizonte e ser cozinhado.

Depois vem as silhuetas e as sombras e os homens de bem, os artistas e os poetas, as crianças e os crianços, dizer que assim não pode ser, que assim não se pode caminhar em frente. No abismo ecoa-lhes, o eco. Depois há um acomodar melancólico, um bem-estar encostado a uma parede morta e parva e todas as considerações que se podem fazer á volta dela, pobre coitada. És feia, és bonita, tens os olhos tortos, tens elementos muito agradáveis e desagradáveis, tens muitas dúvidas, não sabes nada, nada… Mas sabes tudo, tudo sem nada saber. Espera que o Sol se ponha e verás! Verás que a luz só existe enquanto existe a matéria, massa de que todos somos feitos. Ah sim. porque não tenhas peneiras, tu, sim tu, és tão ignorante como eu! Tu que estás sozinho a ler isto, que fincas os pés no chão numa tentativa de equilíbrio constante, se queres compreender alguma coisa tira de cá o sentido. Não sabes ver, não sabes pensar, não sabes sonhar. Deita-te, deita-te na cama e conscientemente, começa hoje já a roer na ponta dos pés e acaba só, quando chegares à ponta do último cabelo. Então, e só então, talvez tenhas inventado o sentido, razão, o engenho.



[Ilídio Salteiro, 1981-2022]


Texto para o catalogo da exposição «ARTES PLÁSTICAS», na Galeria da Câmara Municipal da Amadora, de 15 a 23 de novembro de 1981, com o apoio do Centro Cultural Roque Gameiro. Esta exposição teve a participação dos artistas Amadeu Escórcio, Ana Casanova, Dora Iva Rita, Dulce Araujo, Eduardo Nascimento, Henrique Bacelar, Ilídio Salteiro, Joaquim Lourenço, Luis Manuel Vasconcelos, Manuela Jardim, Maria Machado e Maria Morais. 

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