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I. Salt, Terra, água, ar e 2 linhas, 30", 2008
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Manuel Botelho na Lisboa20 Arte Contemporânea
Rua Tenente Ferreira Durão nº18-b, em Lisboa, entre 7 de Março e 13 de Abril de 2008
Texto que acompanha a exposição:
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CONFIDENCIAL/DESCLASSIFICADO III: emboscada insere-se num conjunto articulado de três exposições nas quais Manuel Botelho apresenta trabalhos em suporte fotográfico realizados ao longo dos últimos 18 meses.
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Prolongando a temática de obras anteriores, das colagens de juventude às pinturas e desenhos do passado recente (Lisboa 20, 2006; etc.), o conflito armado surge uma vez mais como pano de fundo.
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Ao contrário de muitos dos seus contemporâneos, Botelho não combateu em África; apesar disso (ou talvez por isso!), é daí que parte para falar de questões que ultrapassam esse contexto específico. "Assim, trata-se de registar elementos de uma guerra concreta (a guerra colonial) para falar dessa guerra concreta falando também de todas as outras guerras e ainda da guerra como realidade abstracta; trata-se de representar um papel de soldado-símbolo-de-todos-os-soldados para auto-representar o papel de artista em guerra (crise e abismo) consigo mesmo"(1).
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CONFIDENCIAL/DESCLASSIFICADO III: emboscada será talvez a série que mais directamente se relaciona com trabalhos de Botelho dos últimos anos (Museu Nacional de Arte Antiga, 2000; Centro de Arte Moderna, F. C. Gulbenkian, 2005; etc.). "Ao passar do papel de desenho ou da tela quase branca, onde a pintura era quase desenho, para o papel fotográfico verificamos, primeiro, uma mudança de imagens, motivada pela mudança de media, mas a manutenção dos temas e soluções de composição que cruzavam a memória da pintura religiosa com a tradição da fotografia de reportagem política ou de guerra. Emboscada é uma galeria de imagens que podemos referir ao género da auto-representação já longamente encontrada na obra pictórica e desenhística do autor.
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No seu passado recente ele recorreu quer à representação pré-moderna nas artes plásticas (clássica e barroca) quer à representação fotográfica como fonte inspiradora de temas, poses, encenações, adereços... Nessas imagens já o encontramos travestido de soldado e de amotinado, personagem sagrada e marginal, já o vimos assumir todos os sexos e idades, contracenar com outro e consigo mesmo. Esta etapa do seu trabalho fotográfico surge como evolução natural dessa tradição pessoal"(2).
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CONFIDENCIAL/DESCLASSIFICADO II: ração de combate (Fundação EDP, 22 de Abril a 15 de Junho de 2008) pode de modo muito genérico relacionar-se com a tradicional natureza-morta. Inspirado nas desventuras dos militares das unidades de quadrícula (e não só), fala-se de uma guerra de pé descalço, jogos de cartas, álcool, sexo, morte... "desenvolvendo um paroxismo emotivo e histriónico mas sendo conduzidos a uma bidimensionalidade que quase os abstractiza" (3).
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"Num registo neutro e paradoxalmente ainda mais interventivo, mais violento e denunciador de violência do que as restantes séries"(4), CONFIDENCIAL/DESCLASSIFICADO l: inventário (Museu de Arte Contemporânea de Elvas, 15 de Março a 6 de Julho de 2008), a primeira peça deste puzzle, é quase isso mesmo: um inventário, extenso mas imperfeito, de armas utilizadas ou apreendidas pelas forças armadas portuguesas durante o conflito.
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(1) João Pinharanda, "Lisboa: o teatro da guerra", 2008. Não publicado.
(2) Idem.
(3) Idem.
(4) Idem.
(Continuação do dia 10 de Março de 2008)
Depois dos cumprimentos habituais iniciamos uma conversa:
Sabes qual é a diferença entre o Mercado da Arte e a Arte ?
É a diferença entre o viver-se da Arte e viver-se para a Arte!
Depois de uma breve pausa, aproveitada por mim para coçar a cabeça e ele para se assoar de uma constipação em declínio, perguntou:
Dizem que existem Bons Pintores!
Serão os misericordiosos!?
Observando alguma concordância na sua expressão facial, acrescentei:
Também se consta que existe uma Boa Pintura!
Será aquela que tem uma camada pictórica em bom estado?
A aplicação do verniz é fundamental, comentou.
Sem dúvida que estávamos de acordo em muitos pontos. Estas primeiras palavras eram apenas o prelúdio de um concerto mais longo antes da fuga.
(Continua no dia 26 de Março de 2008)
Manuel Gantes, Lugar 4, óleo sobre tela, 108 cm x 103 cm, 2008
Exposição de Ilídio Salteiro e Dora Iva Rita no Salão da SNBA, Sociedade Nacional de Belas Artes em Lisboa, de 6 de fevereiro a 2 de março ...